A Natureza do Amor | Crítica

 



    A banda inglesa Pulp, em sua canção Common People, realiza uma crítica às classes mais abastadas que gostam de praticar turismo social, prática de pessoas ricas de terem seu dia de pobreza. Isso é muito parecido com o que Rose faz em Titanic, do diretor James Cameron.
 
    Em A Natureza do Amor, filme dirigido e roteirizado por Monia Chokri, o conceito de common people estaria ligado não apenas à questão social, mas muito mais intelectualmente.
 
    Na trama, acompanhamos Sophie, uma professora universitária de filosofia, que se encontra em um casamento de dez anos que estagnou a tal ponto que o casal dorme em quartos separados. O relacionamento de Sophie e Xavier evoluiu de uma relação amorosa para uma amizade, um relacionamento de conveniência, visto que os dois têm uma vida intelectual em comum. Mas tudo muda quando Sophie se "apaixona" por Sylvain, um empreiteiro que está reformando a casa de campo de Sophie. Sylvain é o típico homem bonito, mas ignorante, fazendo deles o famoso casal do ditado: os opostos se atraem.
 
    Monia Chokri apresenta um roteiro bem amarrado, visto que apresenta uma história de romance mais pautada na realidade, sem muitos clichês de filmes do gênero, que abordam paixões avassaladoras. O roteiro ainda brinca com as aulas de filosofia de Sophie, explicando as várias fases que a personagem passa, pela visão filosófica de filósofos como Platão, Schopenhauer, entre outros teóricos que falam do amor.
 
    O grande destaque do roteiro está nos detalhes. Sophie se encontra em um relacionamento morto, não apenas sem paixão, mas sem tesão. Isso é evidenciado logo no início do filme, quando ela está observando um casal se beijando e corta para uma conversa do casal que dorme em quartos separados. 
O detalhe aqui não é apenas sobre o casal estar em cômodos separados, mas a distância entre os cômodos ilustra a distância deste casal, que prefere manter a conversa em um tom mais alto do que ir em direção um ao outro.
 
    Quando ela conhece Sylvain, a chama que ela mantinha ainda pequena dentro dela ganha força, o tesão que ela tinha guardado dentro dela é revivido, por isso ela se entrega para ele por completo. Mas é neste romance avassalador que encontramos o núcleo da obra dirigida por Chokri. Enquanto Sophie e Sylvain mantêm o caso extraconjugal, o mundo dos dois não entra em conflito, uma vez que é mantido em segredo. Quando o casal decide publicizar seu romance, é o momento que o mundo totalmente antagônico dos dois começa a colapsar.
 
    Filmes que abordam casais antagônicos não são uma novidade no cinema. Mas o grande trunfo de "A Natureza do Amor" é realmente pautar o roteiro em cima deste antagonismo e como Sophie é uma turista intelectual no mundo comum de Sylvain. Ela acredita amar ele, mas na verdade o que ela tem por ele é tesão. Na metade da trama, o próprio empreiteiro deixa claro isso para ela quando diz: "Vou comer você, já que é por isso que você gosta de mim". A afirmação dele é tão verdadeira que, quando os dois têm sua primeira briga de casal, Sophie busca em um proletariado comum o sexo que tanto a satisfazia com Sylvain, mas só encontra frustração. Essa frustração fica ainda pior quando ela reencontra Xavier, vê que eles pertencem ao mesmo mundo que ela, mas entre quatro paredes, seu ex também não é o que ela procura.

    Quando os dois reatam o relacionamento, é a hora de Sylvain conhecer os familiares e amigos de Sophie, e é neste momento que tanto ela quanto ele percebem que esse relacionamento não será duradouro, pelo simples motivo de que Sophie não está realmente interessada nele, mas sim, em seu sexo. Anteriormente, Sophie também é apresentada à família do empreiteiro, mas a professora de filosofia é muito melhor recebida, pois consegue transitar de forma mais fácil no mundo de Sylvain, pelo simples fato de ser vista como uma inspiração.

    "A Natureza do Amor" é um filme cativante por sua habilidade em evitar os clichês comuns do gênero. Ao invés de se render às convenções esperadas, o filme se destaca por sua abordagem sutil e inteligente das cenas de sexo mais intensas, optando por sugerir mais do que mostrar explicitamente. Essa escolha contribui para uma atmosfera mais sugestiva e provocativa, mantendo o interesse do espectador sem apelar para o sensacionalismo.
 
    Além disso, o filme aborda de maneira fascinante o tema dos "opostos se atraem", explorando a dinâmica entre Sophie e Sylvain, que representam dois extremos opostos. Enquanto Sophie é uma professora de filosofia intelectualmente sofisticada, Sylvain é um empreiteiro mais simples e direto. A forma como esses dois mundos colidem e se complementam ao longo da trama é muito bem executada, adicionando uma camada de complexidade e profundidade ao relacionamento central.
 
    No entanto, apesar desses pontos fortes, o filme sofre com um ritmo de desenvolvimento da trama um tanto desigual. O enredo parece oscilar entre momentos de intensa profundidade e reflexão e outros de menor impacto, resultando em uma experiência cinematográfica um tanto desconexa. Se o ritmo da narrativa fosse mais uniforme e coeso, o filme poderia ter alcançado seu pleno potencial e proporcionado uma experiência ainda mais envolvente e gratificante para o espectador.
 
Nota: 6,5/10